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Maior dependência do governo x liberdade nas decisões: o que esperar de Galípolo no Banco Central?

Após dois anos de relações tensas e até marcadas por trocas públicas de farpas, o presidente do Banco Central Roberto Campos Neto termina o mandato à frente da instituição ao final deste ano. E nesta terça-feira (8), o nome do sucessor indicado por Lula, o economista Gabriel Galípolo, foi aprovado em sabatina no Senado Federal.
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Nome que já era especulado há meses pelo mercado financeiro, o economista Gabriel Galípolo vai assumir o Banco Central do Brasil a partir de 2025 para um mandato de quatro anos — a indicação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi aprovada pelo plenário do Senado por 66 a 5. Mas antes houve muitos questionamentos: foram mais de quatro horas de sabatina na Comissão de Assuntos Econômicos, onde Galípolo respondeu sobre temas como independência, relação com Campos Neto, desafios e, claro, combate à inflação e taxas de juros.
Com relação ao governo, Galípolo afirmou que recebeu a garantia de Lula de que terá liberdade para tomar as decisões monetárias, desde que o "desempenho da função seja orientado exclusivamente pelo compromisso com o povo brasileiro".
A fala acontece em meio à tumultuada relação da nova gestão federal após a eleição do petista e do presidente Campos Neto ao longo dos últimos dois anos. Por conta de divergências sobre a taxa de juros no país, que voltou a subir após a última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), Lula chegou a falar em desalinhamento do banco "com o desejo da nação", além de se referir a Neto como "insensato e desumano". Já o dirigente afirmou que as falas dificultavam o trabalho do BC.
Na esteira das rusgas com o governo, o economista indicado por Lula também foi perguntado sobre a relação com Campos Neto, do qual afirmou que "sempre foi a melhor possível". Também reafirmou o compromisso de atuar no combate à inflação, principalmente no atual contexto de fortes inseguranças globais. Mas o que esperar da nova gestão no Banco Central? O cientista político e coordenador da pós-graduação em ciência política pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Ernani Carvalho, disse à Sputnik Brasil que Galípolo saberá se portar frente à polarização do país.
"A essa altura do campeonato, ele já deve estar bem familiarizado com as pressões que o Banco Central recebe, seja do ponto político, vindas do governo com relação à inflação e taxa de juros, seja com as próprias obrigações que o presidente do órgão possui. A indicação dele para ocupar uma das diretorias [Política Monetária do Banco Central] foi muito nesse sentido", resume.
Para o especialista, Galípolo também terá como um dos objetivos apaziguar as relações do Banco Central com o governo federal e as suas expectativas, em meio ao atual cenário de aumento das taxas básicas de juros para 10,75% também por conta do aquecimento da economia acima do esperado e temor de alta da inflação. "Por mais que o Galípolo tenha lado político, dificilmente vai colocar em risco decisões técnicas [como presidente da entidade] para favorecer uma perspectiva mais ideológica. Há um grau de responsabilidade envolvida, isso tem a ver inclusive com o próprio debate da autonomia do Banco Central em relação ao sistema de controle das finanças públicas e organização da saúde da economia", pontua.
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Por unanimidade, comissão do Senado aprova Galípolo, indicado de Lula para o BC

Qual é o papel do Banco Central?

Para além de garantir o fornecimento adequado à população de dinheiro em espécie e novas tecnologias de pagamento, a exemplo do PIX, o Banco Central atua na regulação do sistema financeiro, política de juros e controle da inflação. Desde 2021, após a aprovação da autonomia do órgão pelo Congresso Nacional, o presidente da entidade passou a ter mandato de quatro anos, iniciado no terceiro ano de governo do presidente da época.
Doutor em economia e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Joseph Vasconcelos lembra à Sputnik Brasil que nos moldes atuais a lei "prevê a possibilidade de ter por dois anos um presidente do Banco Central que não tenha sido escolhido pelo atual presidente da República", como ocorreu com o indicado na gestão Jair Bolsonaro (PL).

"A lei foi criada com o intuito de reduzir a influência política sobre o Bacen, resguardando o mandato do presidente da instituição e de seus diretores, uma vez que após a nomeação, os mesmos não podem ser demitidos pelo presidente sem que haja algum crime ou agravante apontado pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). Dessa forma, passa a ter maior autonomia e liberdade para perseguir o objetivo fundamental da instituição que de acordo com a lei é assegurar a estabilidade de preços", destacou.

Com relação à atuação de Galípolo, o especialista acrescenta ainda que há outros oito diretores que fazem parte do Copom e garantem que nenhuma decisão é tomada "monocraticamente".
"Isso também reduz o viés individual da presidência da instituição. A entrada dela não garante que as pretensões de política monetária almejadas pelo governo Lula passem a vigorar em sua completude na instituição [...]. No entanto, não podemos deixar de frisar que embora não consiga manobrar a política monetária na totalidade, o governo central, ao nomear o presidente do Banco Central e alguns diretores, estabelece players importantes para atuar em seu interesse junto a instituição, o que eleva sua chance de subjugar a política monetária aos seus interesses".

Autonomia financeira e orçamentária do Banco Central

Atualmente, o Banco Central é uma autarquia vinculada ao governo, mas com autonomia operacional e financeira. Desde o ano passado, está em discussão no Senado a proposta de emenda à Constituição (PEC) que abrange a independência também na parte orçamentária e ainda transforma a entidade em empresa pública, aos moldes do que acontece nos Estados Unidos com Fed (Sistema de Reserva Federal, na sigla em inglês). Para o professor da UFRJ, a gestão de Gabriel Galípolo deve atuar para "desidratar" a proposta.

"Ele e Lula já demonstraram publicamente descontentamento com essa proposta. Entretanto, é importante ressaltar que cabe ao Congresso Nacional o poder de legislar e, diante disso, definir o arranjo institucional do Banco Central. Porém, creio que neste momento tanto o governo Lula quanto o futuro presidente do Banco Central vão reunir forças contra o andamento dessa proposta", resume.

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Autonomia financeira do Banco Central: mais interferência econômica do mercado no Brasil?

Juros vão cair no Brasil?

Até o fim do ano, a resposta para o especialista é não. Isso por conta da última ata da reunião do Copom, que aumentou a taxa no Brasil após meses de estabilidade em 10,5%. "Caso não haja mudanças bruscas na conjuntura econômica esperada pelo Banco Central, acredito na manutenção da taxa de juros no patamar de 10,75% e, havendo alguma decisão divergente, a mesma não deve ser muito distante desse patamar. Se houver alguma pressão mais forte para queda da SELIC, a mesma ocorrerá apenas sob o comando do novo presidente Gabriel Galípolo a partir de 1º de janeiro de 2025".
Já o cientista político Ernani Carvalho acrescenta que os acontecimentos internacionais podem mudar totalmente a rota econômica de um país. Isso por conta das dúvidas sobre o Oriente Médio, que pode caminhar para uma guerra total em meio às hostilidades promovidas por Israel.
"É o que aconteceu com o conflito da Ucrânia, que impactou a distribuição de grãos e acabou afetando o preço até o mercado se normalizar, e não veio em uma escalada significativa. Agora no Oriente Médio é outra situação, com uma guerra em escalada e desfechos imprevisíveis que podem afetar o mercado de petróleo. Creio que a maior preocupação do Banco Central será antecipar possíveis bolhas inflacionárias que decorram da disputa", finaliza.
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