"A cúpula do BRICS em Kazan é, sem dúvida, um dos eventos políticos e diplomáticos globais mais importantes deste ano, pois reuniu os líderes do grupo expandido pela primeira vez", disse à Sputnik o professor e pesquisador sênior da Universidade de Joanesburgo Alexis Habiyaremye.
A
declaração de Kazan conta com 134 disposições voltadas para a criação de uma ordem mundial mais justa e democrática, o aumento da cooperação para a estabilidade e segurança globais e regionais, a
promoção da cooperação econômica e financeira e o fortalecimento dos intercâmbios entre os povos para o desenvolvimento social e econômico.
As disposições específicas incluem o consenso entre os membros do grupo sobre a necessidade de reformar o
sistema de Bretton Woods e as Nações Unidas, além de expandir o uso de moedas nacionais no comércio e os compromissos para fortalecer a
cooperação em alta tecnologia e medicina.
"Os resultados mais importantes não são simplesmente as iniciativas contidas na declaração, mas, acima de tudo, o alinhamento estratégico de um grupo tão diverso e o
brilho do poder que irradia ao atrair novos candidatos, como a Turquia. Dado o papel estratégico do país na antiga ordem hegemônica, a presença de seu líder na cúpula reflete a medida do futuro do BRICS em liderar os assuntos globais", declarou, em referência à participação do
presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, no evento.
Diferentemente da antiga ordem hegemônica, o BRICS destaca "a rejeição da dominação e do unilateralismo" e iniciativas que "refletem uma distribuição mais equilibrada de poder e responsabilidades", disse o pesquisador.
"O principal é que o presidente Putin mostra que, apesar da propaganda ocidental de que ele está isolado, ele tem muitos amigos. Muitos presidentes vieram à Rússia", disse à Sputnik Patrick Bond, professor de economia política da Universidade de Witwatersrand, em Joanesburgo.
Dito isso, ainda existem questões que precisam ser resolvidas para transformar o BRICS na força global pela
multipolaridade política e econômica que almeja ser, de acordo com o professor, que citou disputas sobre novos membros. É o caso de países como Egito e Etiópia, que enfrentam desacordos bilaterais sobre a segurança hídrica. "Então acho que foi inteligente não ter novos membros este ano e esperar até que todos sejam assimilados", disse Bond.
Quanto à desdolarização, também há muito trabalho a ser feito, segundo o professor. "Acho que o dilema essencial é que muitos do BRICS, como África do Sul, Índia, Brasil, ainda têm setores financeiros que estão atrelados ao dólar de uma forma que obviamente a Rússia e o Irã não estão mais, por causa das sanções. E novos membros, incluindo a Arábia Saudita, potencialmente, os Emirados Árabes Unidos e o Egito, também estão muito ligados a Washington."
A desdolarização é essencial para esses países, avalia o especialista, já que o
Federal Reserve dos EUA "imprime dinheiro e depois aumenta a taxa de juros, criando estragos em ambos os casos em todo o mundo. Eu atribuiria grande parte da desigualdade [global] ao dinheiro fácil do Fed dos EUA, seus resgates aos próprios bancos. Então
realmente precisamos ver algo diferente."
Em última análise, o que torna a
cúpula de Kazan tão importante "é o momento particular na ordem econômica, em que as economias emergentes produzem mais do que os hegêmones anteriores, mas são confrontadas com constantes ameaças de conflitos, já que o Ocidente não deseja descer sem lutar", enfatizou o professor Habiyaremye.